O vento que bate agita sua roupa e
seus cabelos. Aquela noite por algum motivo parecia bem mais longa que todas as
outras que tinha vivido e sobrevivido e apesar de tudo o que havia passado nada
ainda era suficiente. Tudo parecia ser tão cedo mesmo que o tempo não
importasse. O caminho até o cais era longo e sinuoso, cheio de curvas e golpes
de vista, graças a bebedeira que o abraçou forte durante toda a madrugada, ele retribuía
da mesma maneira o abraço carregando uma garrafa quase vazia debaixo do braço.
E a dança era lenta, os passos, em
falso e o barulho intermitente dos carros passando em cada rua que atravessava
e não notava nada. Ele confiava no senso comum que diz que o divino cuida
melhor de quem não está sóbrio. Pelo menos é o que ele pensa ou pensa que pensa
nisso toda vez que bebe.
O cheiro de mar misturado ao de
suas roupas que rescendiam não a álcool em si, mas a cigarro e a noite, pois a
noite possui um perfume inebriantemente forte que é notado por todos aqueles que
nos olham depois de três madrugadas seguidas: como se ela não quisesse que você
fosse de mais ninguém porque ao contrário do dia, a noite é mulher de olhos
penetrantes, de cabelos escuros, vestidos provocantes e ciúme eterno de quem a
procura nem que seja por uma vez.
Depois de algumas esquinas, de
muitos cruzamentos e de esvaziar a garrafa que trazia consigo, ele enfim chegou
ao cais puxou do bolso do casaco um guardanapo amassado, uma caneta, se apoiou
no parapeito que separa a terra do mar aberto e correu o traço em versos.
Não
te conheço e às vezes não sei se quero ou se necessito conhecer e reconhecer
teu rosto.
Não
sei falar de amor, não vou a Copacabana, não gosto de salsa, o tempero.
Por
mais ridículo que seja, sei que você vai achar esta garrafa com este meu
bilhete. Só te peço um favor: não se faça de rogada, venha ao meu encontro.
Colocou o bilhete dentro da garrafa
vazia e a arremessou com toda a força para dentro da água. Virou de costas e
foi mais uma vez para os braços de quem lhe queria como posse.