segunda-feira, 25 de março de 2013

O novato


O trabalho definitivamente é mais duro do que me disseram quando cheguei aqui. Ouvi um “Não se preocupa! É tudo muito tranquilo. Teu turno é o mais calmo. Escolhemos a dedo pra você a tarefa. Garantimos que cê vai adorar. Seja bem vindo ao time, cara!”

Pois é. Fui enganado, com certeza. A galera dos Recursos Humanos não me passou todas as informações do que eu precisava fazer.  Ainda se fosse uma tarefa por pouco tempo, mas não. Não existem tarefas curtas nessa coisa. Tudo é “progresso a longo prazo”.

No dia em que foram me mostrar o meu parceiro e, sim, é esse o termo que eles usam para com quem trabalhamos embora hoje saiba que é muito duvidoso o termo, eu estava com muita curiosidade para conhecê-lo. Já haviam me adiantado que era um cara, aparentemente tranquilo, com boa saúde e um circulo de amizades razoável. Eu só tinha que ficar de olho nele. Moleza...

A apresentação não foi formal, pois elas nunca são formais nesse ramo. Apenas ficamos de longe vendo o que ele fazia. Era do tipo rato de biblioteca. Fazendo anotações e ajeitando freneticamente os óculos. Ia ser ótimo ficar no meio daqueles livros todos. Eu já não lembrava direito como era aquele tipo de ambiente.

No outro dia já estava sozinho com ele. Eu no comando de tudo. Eu estava muito orgulhoso de mim mesmo. Não tinha como dar errado. Durante duas semanas foi a mais perfeita calma. Ele trabalhava, comia, conversava, dormia. Tudo na mais perfeita ordem.

Até que meu parceiro começou a perder o sono. Tentei de toda forma ajudar a criatura, mas nada feito. Ele não pregava os olhos. Levantava da cama feito um trapo e ia como um zumbi para o trabalho. Depois do expediente passava o resto do tempo na tal biblioteca. Eu já estava muito entediado. Aquele definitivamente não era o tipo de coisa para a qual eu havia estudado.

Eu não entendia o que estava dando errado com ele. Ia para o escritório todos os dias antes do horário para checar os arquivos dele, ver se tudo estava certo e se era aquilo mesmo e aparentemente era ele o designado para trabalhar comigo. Tentei conversar com os mais experientes nos intervalos e nas pausas para o café. Eles me diziam que às vezes isso acontecia mesmo, que era natural. Tudo era uma questão de adaptação minha com ele. Resolvi relaxar e ver o que acontecia dali em diante.

Um dia como outro qualquer e nós na biblioteca, trancafiados lá. Eu folheando um livro que tentava explicar as causas da insônia, ele com a cara enterrada no computador. De repente, senti uma presença diferente. Ao levantar os olhos do capítulo sobre a atividade cerebral durante a madrugada. Vi que ele também estremeceu e pensei

“Ah não. Não pode ser... então é por isso que você tá assim? Tá, vamos embora daqui. Deixa isso pra lá. Muito perigoso. Tu não anda em condições, garotão”

Ele não me respondia. Só ficou lá babando em cima da bibliotecária, que definitivamente nem notava sua existência. Acredita?

Resolvi intervir no caso do coitado. Afinal, era meu trabalho. Ele de súbito, teve um ataque de tosse e ela ao se aproximar para dar a maior bronca no rapaz. Resolveu notá-lo e expulsá-lo da biblioteca. Eu bem que tentei, né? Mas não deu muito certo. Meu parceiro ficou inconsolável, coitado.

É, amigo. Eu bem que tentei, mas era o meu primeiro parceiro. Isso foi há um tempo. Hoje, sou um anjo da guarda com mais experiência. Tenho até carteira e especializações! Ô amizade, traz um cortado aí, por favor, e um prensado!!

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